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30.4.13

#54 - Coincidência

Fotro de Roberto Cambusano

O meu All star era vermelho. O seu também.
O meu All Star era azul. O seu também.
O meu All Star era preto. O seu também.

E nós brincávamos em um arco íris. 

Coincidência? Foi o beijo que você me deu e um falso "eu te amo" que devolvi, no começo de tudo, nas primeiras semanas.

Naquele dia, eu disse que a amava, sem amar, só pra te prender em mim até o amor chegar. Ele, chegou no dia seguinte.

29.4.13

#55 - Te levo comigo


As ruas não tinham sentido, os passos eram em vão, a vida seria em vão se eu continuasse onde qualquer olhar fosse de lembranças. Fiz uma mochila e descobri que carrego dentro de mim aquilo que mais tenho de importante.


Peguei o primeiro ônibus. Comecei tudo de novo. Em uma cidade onde tudo era novo e desconhecido e mesmo assim vejo que nada supre a falta, quando você, mesmo longe, está em todos os lugares e pensamentos. Em mim de todas as formas.

28.4.13

#56 - Sem você não faz sentido

Julien Coquentin - Lassouts, France


O parque já estava praticamente vazio e escuro, e nós deitados sobre as folhas secas. De repente começou uma ventania insuportável, um vento gelado que doía até os ossos. Aos poucos, começamos a nos afastar um do outro. Parecia que o vento puxava os dois para lados opostos. Eu não conseguia me mover, queria correr, me aquecer. Era um frio insuportável. De longe, ela me olhava e ria sarcasticamente. Despedia-se, e eu sem poder fazer nada. Com o vento ela se foi.

Não era possível, como eu não conseguia sair do lugar? O parque já estava escuro e sem ninguém. E o vento aumentava, meu corpo esfriava, até que começou a chover. Quando senti a primeira gota de chuva, comecei a me debater. Parecia uma força magnética me prendendo ao chão. Eu fazia toda força do mundo, e nada me tirava do desespero agonizante. O mundo parecia ser só eu jogado no meio do parque. E aonde ela fora em vez de me ajudar? Será que ela está fazendo tudo isso de propósito?

A água da chuva começou a me arrastar lentamente. Eu não conseguia fazer nada, nenhuma reação. Relei os pés nas águas geladas do lago. Todos começaram a rir. Eu não os via, mas escutava. Aos poucos, aumentava, e eu agoniado naquele meio. Era o barulho do vento, da chuva e dos risos. Estavam gostando de me ver naquela situação. Mas onde estavam todos? Onde ela estava? Por que saiu correndo e rindo de mim?

Abri os olhos assustado, me debatendo e ofegante... As lembranças me resgatam pra mais perto de você, o nosso começo, o nosso primeiro beijo. Agora eu continuo só, como quando me debatia do frio, do vento, dos risos sarcásticos. Nada muda.

Já era noite, e foi impossível não olhar para o céu cheio de estrelas. Mas estrelas não fazem sentido se não temos alguém para dar sentido a elas.

O sonho é uma dor falsa e virtual. A vida real é um sonho com dor, e nós não podemos pedir para acordar. 

27.4.13

#57 - Olhos nos olhos


Foto de Andrei Gindac


Olhos nos olhos. Desde o começo foi assim. As maçãs do rosto ficavam vermelhas, mas eram olhos nos olhos.

Sempre foi o nosso meio de comunicação. Nos amamos pelo olhar desde que nos conhecemos.

Ela já me esperava fazia quinze minutos. Estava sentada embaixo daquela árvore, no lugar que combinamos, abraçando as próprias pernas. Olhava para os lados procurando algo e ao mesmo tempo fingia não procurar ninguém. Cheguei por trás, e ela não teve como reagir, abriu um sorriso de orelha a orelha.

Foi olho no olho. Ninguém disse nada, apenas ficamos nos encarando por um bom tempo, sorrindo um para o outro. Com medo de estragar o sorriso um do outro, com medo de não existir mais nenhum sorriso como aqueles.

– Desculpa pelo atraso  – eu disse para ela.

– Não tem problema – ela respondeu sem tirar os olhos dos meus.

Assunto nunca foi o problema em nossas conversas, mas nesse dia o silêncio fazia mais sentido. O silêncio conciliado com um som ambiente leve. Pássaros, água, pessoas que passavam. Parecia que precisávamos daquilo. O silêncio, aos poucos, nos ajudava a sentir, sentir aquilo que eu nunca havia sentido por ninguém.

Eu ia me aproximando aos poucos, chegava perto aos poucos, deixando-a esbarrar em mim sem querer. Qualquer contato era suficiente para o meu coração acelerar. Ela carregava algo na pele que me fazia sentir tocando uma pétala de flor, uma porcelana.

Mesmo com sol, o fim da tarde soprava um vento gelado. Batemos palmas, juntos, para o pôr do sol, e foi nesse momento, quando sorríamos para o espetáculo no horizonte, que os nossos olhos se cruzaram novamente. Não tivemos o que fazer, não precisávamos de palavras.

Pela nuca penetrei meus dedos nos seus cabelos. Ela já estava entregue. Eu estava entregue.

Paramos no tempo, e quando me dei conta as primeiras estrelas rasgavam o céu. Ela deitou nos meus ombros, e eu aqueci sua pele gelada. Falávamos sobre as estrelas, contávamos as estrelas. Parecia que estávamos juntos havia muito tempo, mas foi a primeira vez que contamos as estrelas juntos, no dia 27 de agosto.

26.4.13

#58 - Encontro marcado com a solidão



Foto de Gabriel Ferri Anca

Durante alguns dias preferiu a solidão. Não saiu de casa. Uma atitude próxima da loucura: a de negar o fim, a separação, a partida.  

Ele ainda imaginava o dia a dia com ela presente. Deixou diversos recadinhos colados na parede do quarto, como se ela fosse gostar da surpresa ao voltar do serviço. Tentou ligar e acabou deixando recado na caixa eletrônica. No fundo, ele sabia que o celular dela estava guardado na gaveta de casa, mas a falsa esperança parecia suprir a ausência.

Chegou a ir à igreja procurar refúgio, tentar resgatar aquela fé que há tempos não tinha. Queria ter algo que suprisse a dor, como se existisse uma receita pronta para isso. Começou a andar por toda a cidade, sem ter rumo certo.

Decidiu, então, ir até o lugar onde tudo começou. Sentou em baixo da árvore onde acontecera o primeiro beijo. Por horas observou as pessoas que caminhavam no parque e não conteve o choro. Deitou sobre as folhas secas que estavam no chão e olhou para o céu.

Na mente vinha a última imagem dela, entrando na sala de embarque. Acompanhou com o olhar até onde pôde, até ela sumir e não poder fazer mais nada. A sua vontade era sair correndo, driblar os seguranças, destruir tudo e chegar até ela. Vê-la pela última vez, impedi-la de ir. Tudo o que ele queria era ter mudado o rumo com que as coisas aconteceram.

Já era final da tarde. Adormeceu deitado sobre as folhas secas, olhando para as nuvens cinzas que cobria o céu.

25.4.13

#59 - Ressaca


Foto de Gabriel Ferri Anca

Foi difícil redescobrir o caminho de volta pra casa. O caminho mais duro. Voltar sem ninguém ao meu lado, à beira de um mar de incertezas. No outro dia senti vontade de ficar sozinho. Ninguém entendia que eu precisava de solidão.

A manhã foi cinza, nublada, sem nada que despertasse a atenção. Uma manhã de fumaça e destruição. O coração ainda sofria a ressaca de um terremoto, cuspia as lavas de um vulcão sem data para cessar.

Tudo remetia a lembranças. Tudo permaneceu do jeito que ela deixou quando saiu, não toquei em nada, podia reviver naqueles detalhes a sua presença. O marca página dentro do livro, a fruteira em cima da mesa, o porta-retratos no criado-mudo, o urso de pelúcia que ela me deu no dia dos namorados.

Em casa ou pela janela, tudo tinha uma marca. No meu mundo, tudo tem a marca dela. Construímos isso juntos, e agora ela me deixou com as lembranças. Essas que tenho medo de perder com o tempo: lembranças da rotina, do contato, de seu corpo gelado, seus beijos, abraços e perfume.

Andava de um lado para o outro, não tinha rumo, não tinha perspectiva, não sabia o que seria da minha vida. Travei no tempo. Agarrei o seu travesseiro ainda ali sobre a cama. Vivi uma eternidade abraçado a ele, naqueles fios de cabelo, no cheiro ainda impregnado, revivi você em mim, mesmo há só um dia longe.

O relógio é inimigo das lembranças: quanto mais o tempo passa, mais elas se esvaem, ficam longe do alcance de quem mais precisa. O tempo não para, somos nós que paramos sem saber como seguir.

Tentei colocar uma música, mas era do silêncio que eu precisava. É a hora em que todas as músicas, todas as letras fazem um sentido e trazem junto a dor. Silêncio.

O dia depois do fim, ou do possível fim, sempre é de reconstrução, readaptação, recomeço. É não saber direito onde estamos e lidar como se tudo estivesse começando outra vez. O amor nos faz renascer a cada nova história. Mas eu não quis renascer, preferi deixar tudo como está.

A aliança está no dedo. Suas fotos continuam no mural, e o envelope que me deu ao partir continua fechado. 

24.4.13

#60 - A partida

Foto de Roberto Cambusano

“Vou embora. Embarco amanhã. Não sei por quanto tempo, mas volto, um dia eu volto. Prometo.”

Não lembro como eu recebi essas palavras, mas ela disse sem nenhum ensaio. Na lata. Nunca tão objetiva. Me pegou pelas costas, e de uma hora para outra o mundo parou. Não respondi aos comandos, apenas ao amor, ao pensamento de como eu iria seguir a vida sem ela. Como iria inventar outra rotina, suprir essa falta? Como ela iria deixar o nosso amor para trás, sem mais nem menos, abandonar a nossa história, juntos há tanto tempo, e partir?

Poderia tê-la questionado, exigido resposta, usado a razão, mas foi a emoção quem me guiou.

A primeira lágrima caiu.

Larguei tudo e decidi passar com ela as últimas horas que eu podia. Cada minuto parecia o último. Uma tortura. Uma incógnita.  Queria que fosse como um simples “boa noite” e no outro dia cedo pudesse acordá-la e continuar a vida, como sempre foi desde quando nos conhecemos. Mas não foi assim.

A primeira despedida foi desejando boa noite.

A segunda lágrima caiu. A terceira, quarta. Chorei a noite inteira.

Covarde. Era isso que eu sentia ser. Arrumar a mala da pessoa que eu menos queria longe de mim. Arrumar a mala para um amor partir sem data pra voltar. Arrumei e fiz questão de carregar até ao aeroporto, fazer check-in, dar um abraço e um último beijo. A covardia é você não correr atrás de seus objetivos, e o meu deveria ser impedi-la de partir.

Ela partiu. A única coisa que deixou foi um envelope, que ainda não tive coragem de abrir.

Cheguei em casa já de madrugada, deitei a cabeça no travesseiro e escutei o celular tocar. Peguei o aparelho no susto na esperança de que fosse uma mensagem de boa noite, como sempre. Mas essa era a primeira noite de um mundo agora sem ela.

A última lágrima caiu.

23.4.13

APRESENTAÇÃO


Uma história de amor nem sempre é feita somente de realidade, é também fantasias, sonhos e ficção. Elementos fundamentais para sair do plano real e descobrir o sabor abstrato de uma paixão.

Tudo começou quando eu soube que a passagem dela de volta já estava marcada. Faltavam 93 dias para o retorno. A princípio pensei em criar um blog retratando esses meus 90 dias à espera da sua volta, mas decidi esperar e começar agora, com 60 dias. Se agora você sabe que a passagem dela de volta está comprada e não está entendendo muito bem essa história, deixe-se levar pelo que vai ser contado aqui.

O blog é um projeto de criação literária, onde meus sentimentos e a minha escrita irão definir a intensidade com que os textos serão criados. A princípio um desafio. Serão 60 postagens que vão resgatar uma história que se formou e que com a ajuda do texto pretendo eternizar.

Tudo que for postado aqui é ficcional, é uma criação literária, inspirada em uma pessoa, inspirada em uma história, um futuro que eu nem sei se um dia vai chegar. Essa história é inspirada no amor que a partir de agora está registrado, está eternizado e na literatura nunca terá fim.

Foi uma necessidade. O que um autor coloca pra fora sempre é necessidade. A necessidade da alma de  transformar em palavras aquele sentimento que não consegue mais segurar. Eternizar uma história. Faltou coragem para fazer uma tatuagem com o nome dela (É brincadeira, pois não gosto de tatuagens), então decidi transformar em algum tipo de literatura. 

Eu também não sei o que vai sair até o fim deste blog, mas te convido a acompanhar essa experiência e compreender que o amor está nas coisas mínimas da vida. 

Por fim, dedico todos os meus escritos à pessoa que me inspira, Thainá Gondim.