Ivan Ovchinnikov - Russia |
Voltei ao ateliê. Ela tocava uma música no piano e não me
percebeu entrando. Tocava tão bem.
- Você nunca tocou piano, como é que agora está tocando tão
bem?
- Eu aprendi, oras. O tempo passa. Mas não é só o tempo,
existe outra coisa nisso tudo.
- A saudade dói tanto. Olha pra mim?
- Não, não vou olhar. Você precisa respeitar as coisas, eu
já disse.
- Eu estou respeitando.
- Mas precisa ainda mais. Passar por momentos difíceis
significa amadurecer. Não pense que não está doendo em mim.
- Você não me deu resposta quando partiu, e eu acreditei
apenas no nosso amor. Eu confiei em você.
- E deixou de acreditar? Continue confiando.
- A memória vai embora aos poucos e eu tenho medo de tudo
que se desfaz. Um medo tão forte. É tão ruim deixar você ir embora pelas
lembranças.
- Tudo se desfaz propositalmente. O tempo não engana
ninguém.
- Mas eu não quero deixar ele se desfazer. Desaprendi a
viver sozinho.
- As lembranças são vertentes do tempo, saiba disso.
- A memória também.
- Eu terminei aquele quadro, amor.
Eu fui até o quadro e de imediato senti a profundidade da
pintura na nossa história. Ela conseguiu atingir o meu ponto fraco. Esperanças
bailavam em mim, em nós, até que ela começou a tocar uma música no piano. Aquelas
notas fizeram com que eu embarcasse em outra dimensão da nossa história.
(continua amanhã)
Nenhum comentário:
Postar um comentário